sábado, 23 de janeiro de 2010

“A Dura Caminhada Para os Montes - II”

“A Dura Caminhada Para os Montes - II”



O dia nascera nebuloso e frio. Os pássaros já cantavam com a chegada do Sol; que mesmo escondido atrás das nuvens fluía seus raios dourados; começando o processo de “banho dourado” das divinas terras. Os gritos das araras e dos pardais no infinito da floresta; despertando o jovem sonhador; que se espreguiçara lentamente entre as folhas secas; e abrira os tristes e remelados olhos, recebendo mais um lindo e sublime dia de vida! Seu corpo estava sujo devido ao longo tempo que não se lavara; estava insuportável.


Levantou-se a olhar para o horizonte, ainda sonolento, apoiando uma das mãos num tronco de árvore, e lembrou-se da luz que vira no dia anterior, mas, não fazia ideia em qual direção ficava.


Olhou para trás e viu que já estava longe do Paraíso das Águas, já estava em um local desconhecido. O local o qual se encontrara agora, é um imenso mundo verde; porque há em abundância vegetações enormes; que impediam de a luz natural tocar-lhe por completo. Em meio esse enorme “mundo verde” encontra-se pequenas nascentes, onde pôde em uma delas, matar sua sede e lavar-se por completo.


Enfim abrira um pequeno foco de luz em meio aquele paraíso verde, era à saída do mundo verde. Ao sair da enorme vegetação, vê uma ponte de madeira; bem velinha, onde embaixo há um pequeno riacho, dando passagem para outro lado. Ele teme-a, e por ela não segue caminho.


Depois de três horas caminhando sem parar, o corpo pedia energia, e deitou-se sobre uma enorme rocha; ofegante, a olhar para o céu que brilhava intensamente. Coitado, não tinha mais destino, mal havia se alimentado e empacou ali mesmo. As intensas caminhadas durante a noite, fora demais para ele; caíra exausto sobre a rocha.
Do outro lado, há uma pequena casa de madeira grossa, bem construída, desenhada, polida por fora... Em frente um lindo jardim de flores aromáticas, outras plantações rasteiras e bem cuidadas!


Defronte ao quintal da casa, uma pequena princesa de cabelos negros e longos, brincava com um pequenino cãozinho, sorrindo largamente, por está ali, vivendo o momento sublime de sua jovem vida! Rolara na grama fofa da enorme casa o pequeno cãozinho, que também estava alegre.


Num momento de distração, o pequeno cãozinho vê ao longe o pobre jovem deitado sobre a enorme rocha, e começara a latir continuadamente. A pobre menina estranhara o seu bichano por alguns instantes, porém, quando olhara para trás, viu o pobre jovem; correra para enorme casa de madeira, quase defronte ao riacho.


A pobre menina entrara na sala ofegante e de cabeça baixa, mal conseguia falar, porque lhe faltara ar. Defronte de si, um senhor aparentando ter mais ou menos uns cinqüenta anos de idade, olhava para ela com um rosto castigado pelo tempo que jamais o perdoara. Vendo que a menina estava assustada, perguntou-lhe calmamente segurando-lhe as mãozinhas:


-O que aconteceu Nayá?


A menina não lhe respondera de imediato, estava se recuperando, instantes depois:


-Tem um homem lá fora deitado sobre a rocha do outro lado do riacho!


-Como?


O velho se surpreendera com a narração da pequena Nayá.


Lembrou-se logo que poderia ser algum inimigo se aproximando do seu território. Lembrou-se das antigas batalhas que tivera alguns anos atrás; para conquistar seu espaço na sagrada terra. Então, apoiou-se de imediato ao braço da cadeira de madeira, apagou a luz da vela, que estava sobre um pratinho de porcelana, e seguiu para onde se encontrara o pobre homem. Ia armado porque não sabia ele que se tratara de um pobre jovem. Ao vê-lo de longe, com os olhos cansados e profundos de sua pesada idade, lembrou-se de si mesmo; que vivera situação semelhante em tempos de outrora. Parecia ver a sua vida passar defronte de si. Porém, não era.


Vendo que era apenas um pobre rapaz, encostou sua arma ao canto de um barril, e foi em direção ao riacho.


Atravessou o riacho com cautela, em direção ao jovem que ainda dormia sobre a enorme rocha, porque sua força não era a mesma de sua juventude. Mesmo destruído pela sua pesada idade, aproximou-se do pobre jovem inofensivo, pegou-o no colo e levou-o até a sua pequena habitação de madeira.


Via marcas de feridas causadas por insetos que o castigara durante a noite cruel, e olhou para frente onde Nayá se encontrava, do outro lado do riacho; e disse-lhe ao longe:


-Pegue as ervas na gaveta do armário, ele está muito mal!


A menina correra de imediato para buscá-las, enquanto o Velho atravessava o pequeno riacho; mostrava uma força incrível nos braços gastos.


Ao chegar defronte a casa, deitara o pobre jovem na grama fofa que era cuidada delicadamente por Nayá, que conhece como ninguém a natureza. Fazia sombra, porque os três estavam protegidos pelas árvores. O Sol agora era um pouco mais fraco que dantes, porém, para segurança de uma vida, o melhor é deixá-lo a sombra fresca e deliciosa da mãe natureza.


Nayá trouxera uma pequena caixa, a qual continha vários tipos de ervas diversas. Com um pedaço de pano úmido, Nayá limpava o rosto do pobre jovem, enquanto o Velho socava algumas ervas, para misturá-las com água morna e dar ao enfermo.


A tarde chegava pausada, com os cantos das araras. Ouvia-se claramente o som das águas do riacho, que escorriam limpas e graciosas e calmas. A brisa era agradável. As borboletas passeavam entre as flores brancas que enfeitavam a fronte da casa; um pouco mais distante, podia-se ver outra habitação: era a Fazenda de São Vicente dos Milagres. Pois bem, deixemos os detalhes da fazenda para o capítulo a seguir.


Nayá e o Velho continuavam a tratar do jovem defronte a fortíssima casa de madeira que estava totalmente coberta pelo Sol, que engolira por inteira a mesma. Estava ainda desacordado o coitado do mancebo, pois, estava sendo vigiado constantemente por Nayá, enquanto o Velho saíra para pescar no riacho. Com um vestido de cambraia gasto pela necessidade de sua humilde vida, colocara um cesto com frutas frescas ao lado do jovem, e saíra para brincar com o pequenino cãozinho de estimação.


A beira do riacho com a vara de pesca em mãos, o Velho ao longe perguntara a pequena:


-Ele já abriu os olhos?


-Não – disse a pequena sorridente a correr atrás do bichano que sempre estava agitado.


Uma pequena família de patos passeava defronte a propriedade, todos enfileirados, a mãe ia à frente; enquanto os filhotes seguiam-na tranqüilos. O pequeno cãozinho correra em direção aos pobrezinhos que mal caminhavam ainda, porque não tinha forças o suficiente para correr. Ia em média velocidade, até ser seguro pelo jovem que finalmente acordara:


-Acalme-se amiguinho!


Abraçava o pequeno bichano com um largo sorriso! Estava bem disposto e tranqüilo na sua paz sublime! O cãozinho latia insistentemente suspenso no ar, enquanto o jovem sorria de contentamento para o pobre animal.


Ao ver Nayá, pousa o bichano na grama rasteira e vai em direção a ela:


-Antes de me apresentar a você e ao seu pai, devo agradecê-los por cuidarem de mim. Eu me...


Quando ia proferir a palavra, o Velho perguntara-o de onde vinha e qual era a sua intenção ao circular pelas aquelas terras. Sem titubear, o jovem lhe respondeu:


-Eu refugiei-me cá, para livrar-me do Paraíso das Águas.


-Você também veio de lá? – perguntou à pequena Nayá curiosa, porque conhece aquela
região como ninguém.


-Sim – respondeu o jovem educadamente.


-Maldito Paraíso das Águas! –resmungou o Velho com fúria!


-O Senhor também já morou lá? – perguntou o jovem curioso.


-Sim! – respondeu o velho com entusiasmo.


-As pessoas lá são muito egoístas e incompreensíveis – disse o jovem para o Velho e para pequena Nayá.


-Nós sabemos – respondeu Nayá afirmativamente.


-Isso não é verdade – disse o Velho discordando do que ambos disseram, e continuou – conheço muitas pessoas lá, e sei muito bem como é aquele ambiente. As pessoas são boas; isso eu lhes garanto, porque lá vivi por muitíssimo tempo. Porém, há pessoas más também.


-Não é possível - disse o jovem inconformado com as palavras do Velho.


-Claro que é possível. Morrer-lá-ia caso não fosse à estúpida guerra do ouro! Por que você diz isso? Tu deves ter um motivo muito forte para nos dizer isso, porque naquele lugar, só não vive feliz quem não quer. Afinal de contas, qual é o seu nome?
O jovem ficara calado pelo impacto das palavras do ancião, e logo se apresentou para ambos:


-Eu sou Robert, vim de Coimbra em umas das dezenas de naus que viera cá para o Brasil; refugiando-se das tropas de Napoleão, procurando uma vida melhor...


-Prazer, eu sou Nayá – disse a menina com um largo sorriso de alegria!


-E eu sou João Rodrigues, mas, pode me chamar de Velho das Montanhas.


-Mas... Por que Velho das Montanhas? – perguntou Robert.


-Olhe a sua volta.


Ao ver todo o território que se encontrava, encantara-se com a beleza e as enormes montanhas que os rodeavam; repletas de rochas gigantescas e vegetações infindas. Via as aves sobrevoarem suas cabeças e o bailar das borboletas, que brincavam com as mais belas e delicadas flores cheirosas; que habitavam aquela imensa região. Muitas dessas montanhas choravam a todo tempo; isso porque havia fontes inesgotáveis de água; e conseqüentemente, essas fontes formavam muitas cachoeiras, que formavam também, as fluentes dos inúmeros riachos; que eram quase infinitos... Admirado com a bela paisagem verde, Robert fala docemente:


-É lindo este lugar!


-É sim – respondeu Nayá com orgulho e satisfação!


-É o lugar mais precioso do mundo, disse o Velho exageradamente!


-Você deve estar com fome, coma algumas frutas – disse Nayá para Robert que estava sentado em um velho tronco.


-Vá meu filho – disse o Velho concordando com a pequena Nayá.


-Espere.


-O que foi Nayá?


-Nada, deixe que eu mesma leve-as para ele.


-Pois bem! – concordou o Velho.


Nayá fora até a frente da residência; pegar o cesto com as frutas, enquanto o Velho conversava com Robert:


-Você disse que estava procurando um lugar melhor para viver certo? Viva conosco! Aqui é um ótimo lugar!


-Sim é fabuloso! Vocês são muitos generosos, obrigado pela hospitalidade!


O Velho apenas sorrira de satisfação, com o coração alegre!


A natureza ia fazendo sua parte. Contava mais ou menos quatro horas da tarde; talvez de sábado ou domingo, era um belo dia! Três folhas secas desprenderam-se de um galho velho e seco, caem no chão; e logo são levadas por uma leve brisa que passava rasteira. Já era possível ouvir o canto das cigarras ao longe, e, a beira do pequeno riacho, alguns animais bebiam água, porque o calor era muito forte. Ao longe, em direção a pequena cidadezinha de Ana Lúcia, podia-se ver o lindo pôr-do-sol; que dormira atrás das sagradas montanhas; para acordar alegre no dia seguinte!
As estrelas iam aparecendo aos poucos. Ainda era possível ouvir o canto dos pássaros, que ainda ecoavam agradavelmente. O céu fazia-se cor de vinho, a lua iluminava todo o ambiente, que tinha apenas um morto silêncio! O canto dos grilos a noite ajudava a completá-la, enquanto luz da lua derramava-se sobre a Terra!
Na casa de madeira, somente Robert e o Velho estavam acordados, exceto Nayá, que dormia com os anjos. Robert falava para o Velho como era a vida no Paraíso das Águas; das pessoas que lá vivem e do progresso! O Velho balançara a cabeça negativamente, e disse para Robert:


-Aquele lugar será destruído pela ambição do homem! Como pode haver progresso, em um lugar, onde todos só pensam na extração do ouro?


O jovem Robert calou-se. O Velho continuou e encerrou a noite:


-Filho – disse o Velho docemente para o rapaz, e continuou – a ganância dos homens fizera-me sair de lá. Eu também quando saí de Lisboa, pensava encontrar ouro e outras especiarias, porém, o que Deus reservou para mim, foi este lindo lugar. Hoje moro cá, em paz, não tenho mais interesse algum pelo ouro ou por outra jóia preciosa, quero apenas viver minha vida que já se esgota, devido ao tempo. O tempo é um grande vilão sabia? Quando você se dá com ele, percebe que o mesmo lhe faz envelhecer. Vamos dormir, já é hora Robert.


-Sim senhor.


O velho pousou ali mesmo, no tapete dá sala, e disse para Robert:


-Suba a escada de madeira, lá tem uma alcova para ti. Já está arrumada; é só deitar-se e dormir.


Robert carregava consigo um pequeno candelabro, porque a casa estava dominada pela escuridão.


Na sala, o Velho apaga a luz do candeeiro, e pousa a cabeça levemente no travesseiro. Deitado no tapete da sala, o Velho faz um pequeno comentário sobre Robert: “parece ser um bom garoto” pensava ele. Sentiu a leve brisa que adentrava pela janela sem pedir licença, e, fechou os olhos; e morreu no profundo e maravilhoso sono!

Nenhum comentário:

Postar um comentário